Queda cupida

Sofia e Antenor eram um casal apaixonado. Ele, violinista, spalla de uma famosa orquestra sinfônica e músico de cerimoniais e ela, professora de inglês de uma rede de franquia. Viviam um conto de amor.

Mas os gostos de ambos nem sempre batiam. Antenor não gostava muito de sair. Volta e meia tinha um ensaio ou um concerto para se apresentar em algum teatro, o que já tomava parte do seu tempo. A namorada ia junto, a contragosto, já que não aguentava mais ouvir Beethoven, Bach. Mozart, Verdi e outros dessa linha. O que ela gostava mesmo era de um bom pagode e um churrasco com os amigos, aliás, tinha o samba no pé.

Só que os pés da menina sequer pulavam para o quintal de casa desde que começou a namorar com Antenor. Às vezes ela parava para perguntar o motivo de estar com o rapaz se as diferenças eram enormes – talvez o sexo seria a motivação maior, sintonia e sinfonia perfeitas.

As saídas da professora se limitavam à casa do namorado e às apresentações do amado. Essa vidinha sem graça de ouvir música clássica e erudita já não mais a agradava, aliás, nos últimos encontros musicais a moça dava um jeitinho de levar às escondidas um fone de ouvido para escutar seus sambinhas preferidos enquanto a plateia se deleitava de prazer com toda aquela barulhada suavemente sincronizada.

Sofia passou a procurar algo realmente interessante para fazer. Seu desejo latente sempre foi ser passista de escola de samba, mas isso seria demais para o mocinho ciumento, que mal a deixava sair com as amigas para um arrasta-pé ao som de tamborim, pandeiro, reco-reco, cavaquinho, uma boa caipirinha e muitas risadas.

Mas ela precisava dar um sacode na vida, um chega pra lá no tédio, fazer alguma coisa, se sentir livre, leve e solta, como se estivesse em um desfile de escola campeã.

Resolveu, então, fazer algo para se exercitar. Comprou um par de patins e fez uma surpresa para o namorado, dando a ele um modelo igualzinho ao seu. Só o que a jovem jamais esperava era a reação do bonitinho.

_ Você não sabe que eu sou artista, o principal da orquestra e que não posso me machucar? _ esbravejou o “astro-mor” das cordas.

Com receio de se acidentar, Antenor jamais praticava esportes, tampouco os que poderia causar algum dano em seu braço, punho, mão ou dedos, suas maiores e mais valiosas bases de trabalho. O medo era tamanho que o músico fez uma apólice de seguro desses membros para garantir que nenhum mal o aconteceria em caso de algum incidente qualquer mas, na dúvida, preferia evitar qualquer risco, motivo pelo qual se excedeu ao receber o mimo.

Passada a decepção da mulher, que entendeu a preocupação do rapaz, só não a rispidez ante a surpresa do regalo, decidiu curtir sozinha o brinquedinho e pegou de volta o presente dado ao belezura.

Os fins de tarde passaram a ter um ar diferente na vida da moça, que ganhou gosto pela patinação e já arriscava algumas manobras diferentes. Ela estava tão alto-astral que até os desagradáveis concertos do namorado tornaram-se mais amenos aos seus ouvidos.

Só quem não parecia se agradar muito era Antenor, que se incomodava ao ver a empolgação da namorada em sua atividade esportiva e saber das novas amizades da moça. Passou a controlar a amada com um aplicativo que mostrava seu percurso e tempo de atividade e movimento. Sim, ela tinha que mostrar para ele seu desempenho esportivo.

Para tentar impedir suas saídas diárias, o musicista teve a ideia de esconder o capacete da querida, item necessário de proteção no quesito segurança a quem anda sobre rodinhas.

Ocorre que o entusiasmo de Sofia era tamanho que mesmo sabida de o quanto poderia se prejudicar sem o tal equipamento resolveu sair para treinar um pouco.

Tudo caminhava e caminharia perfeitamente bem, não fosse o asfalto rachado de material de quinta categoria da empreiteira que venceu a licitação do recapeamento do parque que a bela curtia seu brinquedo preferido. Maldito prefeito, que se fez de cego, surdo e mudo nessa empreitada de qualidade duvidosa. Enfim, parafraseando o sábio Nelson Rodrigues, Sofia beijou o asfalto. Sim, desequilibrou-se com os seus patins naquele mar de propina….

Sem sequer conseguir sair do lugar, e zonzinha da Silva, a moça se deu conta de que não poderia ter saído de casa sem o tal protetor, mas como diria Luís de Camões em “Os Lusíadas”, já era, fia, “agora Inês é morta”, caiu, levanta e vai atrás do prejuízo.

Com muita dificuldade e corpo dolorento, Sofia entrou em um pronto atendimento médico e somente depois de quase duas horas foi atendida por um rapaz ruivo, de sardinhas no rosto, olhar sério e fala ríspida.

_ Olá, mocinha! Já sei o que aconteceu. Que bonito, hein! Você acha que pode pegar um par de patins, sair por aí feito uma doida, de qualquer jeito, sem capacete e se esborrachar toda? Tá achando que a sua cabeça é coco? Não é, não. E olha quanta gente aqui pra eu atender. Da próxima vez, se for pra esquecer o juízo, nem sai de casa.

_Olha aqui, senhor enfermeiro, eu não vim até essa espelunca para ouvir sermão de ninguém. Tudo está doendo muito, não consigo mexer a mão, mas quer saber de uma coisa, vou embora daqui.

_ Quietinha que você já aprontou muito por hoje, não acha? Fica aqui, sentadinha, vou fazer um raio X mas já deu pra ver que também torceu o pulso. Acha que vai resolver isso onde, na padaria, no açougue? Para de reclamar que eu já te atendo.

Ela já não sabia se ficava ou esperava, mas a dor era tão grande que resolveu ficar por lá.

Trinta minutos depois, o mesmo profissional atendeu a moça, que teve que imobilizar o antebraço.

_ Por sorte não foi nada grave. Só mesmo o pulso. Quinze dias de molho, sem sequer olhar para o patins, fui claro? _ ordenou o ruivo.

Com os nervos mais amenos, os dois conversaram por alguns minutinhos e descobriram que eram amigos de infância. A empatia passou a reinar no recinto e os dois até trocaram contatos, segundo o moço das sardinhas, para saber sobre a evolução da recuperação.

Assim que foi liberada no pronto-atendimento, Sofia seguiu para a casa do namorado, que não conteve a cara de felicidade ao ver a amada impossibilitada de andar por aí livre, leve e soltinha sobre suas rodinhas.

O tédio da moça aumentava a cada dia. Lembrou-se do enfermeiro estressado e passou a conversar com ele vez em quando em mensagem de celular.

Os tão esperados quinze dias se passaram e Sofia foi retirar o gesso do braço. Eis que o não mais bravo rapaz foi quem a atendeu novamente. Papo vai, papo vem, não é que a recém-patinadora convenceu o cara a dar uma voltinha de patins? Emprestaria a ele o presente que seria do namorado, que continha todos kit de proteção, e disse que ensinaria os primeiros passos, ao passo que ele topou o desafio.

Aula vai, aula vem, os dois passaram a se conectar cada vez mais, até que, enfim, findou o namoro morno da jovem com a estrela das notas musicais.

A nova dupla de patinadores passou a curtir cada vez mais as aventuras do esporte e, após descer uma ladeira daquelas de dar um friozinho na barriga de qualquer veterano, o ruivo ajoelhou-se de frente para a bela, tirou do bolso uma caixinha contendo um anel de noivado e declarou seu amor, pedindo a namorada em casamento, que sem titubear aceitou na hora.

No dia do casório, tudo pronto, capela arranjada com flores do campo, as preferidas de Sofia, e um presente surpresa do noivo, uma entrada triunfal, ao som do samba predileto da noiva, tocado por um renomado musicista, contratado pela cerimonialista do evento.

Sem saber quem era aquela mulher toda branco, véu e grinalda, com ar de pessoa livre, leve e solta, seguindo em passos lentos em direção ao futuro esposo, estava Antenor, tocando, a contragosto, uma música bastante diferente das de seu costume e preferência.

Assim que a música parou, o violinista se deu conta de quem se tratava naquele altar. Visivelmente atordoado, pegou seu violino e saiu, afoito, rumo a qualquer outro lugar que não fosse aquele ambiente alegre. Ao descer a escadaria, tropeçou e caiu sobre um dos braços, o que lhe resultou em uma licença de seis meses de trabalho.

Lembra do seguro do rapaz? Pois bem, vencera três dias antes do incidente e o pobrezinho esqueceu de renovar. O capacete da ex? Queimou e jogou as cinzas no rio.

(Imagem: Freepik)

A foto do seu ex pode virar um hambúrguer

Se na próxima semana você for viajar para os Estaites, não deixe de levar umas fotinhos do seu ex. Não, não é para matar a saudade do fulano ou da sicrana e sim para usar a imagem do beltrano ou beltrana para saciar a fome ou explorar a sua gula.

Calma que você vai entender: a rede Burger king lançou nos Estados Unidos uma campanha para o Valentines´day (Dia dos Namorados de lá), comemorado em 14 de fevereiro. Quem levar uma foto do ex ganhará um Whooper na faixa.

Tá vendo, pra quem dizia que ele ou ela nunca valeu nada, pelo menos a figura agora vale um lanchão, olha que troca boa: uma foto do desgramado (a) por um hambúrguer.

E se por lá a rede de fast-food está investindo nos desenlaces, aqui no Brasil a marca lançou o “Combo da Abstinência”, sob forma de deboche ao programa sugerido pela ministra Damares Alves de incentivo à abstinência sexual dos jovens, medida um tanto quanto, sei lá até o que falar sobre isso, da. Pra quem ficou curioso, aqui o BK oferece o Rebel Whopper, sanduíche feito com hambúrguer à base de plantas + refri e batata frita, com precinho especial –  o slogan da promoção é “os prazeres da carne, mesmo sem carne”.

Se a gente parar para pensar, essa campanha no Brasil tem até uma relação com a ação norte-americana, afinal de contas, se é ex não rola mais nada, correto?

Bom, está dado o recadinho, vai curtir a liberdade na terra do Tio San, leva a fotin…