Lisbela e o marido ogro

Lisbela e o marido ogro

Numa manhã em que o sertão despertava em brasa ardente, Lisbela, mulher das muitas luas já vividas, se viu enredada num sonho que mais parecia uma ciranda de memórias, resgatando afetos de um cabra arretado que se escafedeu no meio da roça. Ainda de pijama, com os olhos inchados de tanto dormir, a sonhadora se assentou à beira da cama e continuou a sonhar, dessa vez acordada.

Aquela aurora, em que a terra exalava calor e fervor, se desdobrou numa tarde de domingo escaldante e animada, repleta de lembranças que bailavam ao som do crepitar das labaredas que afagavam o solo.

Não fosse o marido, sujeito firme e rude, ter sacolejado a esposa para lhe fazer um café puro e amargo, enquanto o sol derramava sua luz sobre o rincão sertanejo, certamente ela dormiria novamente só para saber que fim daria aquele sonho, que parecia ser demasiado de bom.

Sem alternativas, a mulher fez-lhe um pedido singelo:

_ Ó, meu amado, teria a bondade de fazer um afago na alma dessa criatura que vos fala só para mostrar seu chamego arretado por mim?

Com expressão de quem estava mais acostumado com a secura do sertão do que com requintes amorosos, o moço grunhiu em resposta, aguardando a solicitação.

— Poderia encontrar, colher e me trazer uma flor azul com espinhos vermelhos?

O marido a encarou, perplexo, como se o pedido fosse mais absurdo que um cangaceiro dançando xaxado na praça.

— Uma flor azul com espinhos vermelhos? Isso é coisa de conto de fadas, mulher! Não tem no sertão quem plante tal encanto. E você, com esse xale velho, está mais pra um cacto espinhento que pra Maria Bonita. Parece até que comeu rapadura com pimenta, diacho.

Imperturbável em seu desejo e incomodada com a comparação, a mulher ordenou:

— Se vira, valentão. Volte só quando encontrar.

O rapaz partiu, em uma jornada que mais parecia uma travessia pelo deserto. Enquanto cruzava os rincões secos em busca da tal flor exótica, Lisbela contemplava o vasto horizonte, onde o calor tremulava como ondas de um mar de saudades.

— Que tempo foi esse que passou tão depressa e que agora parece não passar nunca mais? — questionava a moça, na esperança de encontrar respostas para suas escolhas.

A tarde se despedia, saudando o anoitecer, quando surgiu um sujeito de trajes singulares. Era um homem de beleza que até assustava, esbelto e elegante, trazendo consigo um buquê de flores azuis entremeadas por espinhos rubros.

Pena que Lisbela acordou do sonho com outro chacoalhão do comparsa de movimentos bruscos, que não encontrou a tal rosa exótica, mas fez questão de dar a ela um pequeno xique-xique como forma de seu afeto.

Ela sorriu para o marido, levantou-se e foi botar o feijão no fogo.

Este texto é uma adaptação do conto original A mulher sonhadora e o marido ogro, de Claudia Rato, reescrito pela Inteligência Artificial a pedido da autora para a versão do escritor Ariano Suassuna. A proposta era ver como ficaria essa escrita com o uso dessa tecnologia no tempo e ao estilo do autor supracitado. Vale ressaltar que o texto da plataforma de IA passou por inúmeros ajustes a pedido da autora para explorar e chegar o mais próximo possível da escrita de Suassuna. A imagem também foi extraída de I.A. O mesmo conto também passou por adaptações na linguagem escrita dos autores Franz Kafka, sob o título Gregorlínea e a flor rara; Eça de Queiroz, em O despertar de Euseclânea e Machado de Assis, em Devaneios matrimoniais: Euseclânea, o ogro e a quimérica flor azul. Também cabe destacar que o conto adaptado de Suassuna foi o que mais se aproximou da realidade linguística do escritor, sendo que os primeiros não sofreram tanta alteração da autora do conto original após passar pela plataforma.

Mulher vingativa: veja o que fez uma ex

Mulher vingativa e agora livre e rica

Cleptonilda era casada com Gilvandêncio, um casamento perfeito, típico de causar inveja às amigas e vizinhas. Estava muito longe de um dia pensar em se tornar uma mulher vingativa – não havia motivos para isso.

Mas como a perfeição mora no mundo das ideias, uma traição do marido veio à tona e o castelo da moça ruiu.

Sabida de seus direitos de mulher casada, tratou de colher todas as provas da traição e contratou um advogado.

O que Clepto não esperava era mais uma rasteira amorosa. O marido era tão sedutor, mas tão sedutor, que acabou seduzindo o advogado que, na audiência do divórcio, virou a casaca e ficou do lado do cara e a mulher não recebeu sequer um centavinho do pouco que havia construído com o canalha em dez anos de matrimônio, suor e muito esforço.

Cego de paixão, o advogado, que era riquíssimo, se casou com Gil em regime de comunhão total de bens, afinal, o amor estava em primeiro lugar.

Para se vingar de ambos, a ex, abalada com a dupla traição, procurou uma mulher para seduzir Gilvandêncio, até que ele foi pego no flagra pelo então marido doutor.

O advogado se separou, mas perdeu metade dos seus bens.

Com os mesmos dotes sedutores de uma década atrás, Clepto conseguiu reconquistar o ex, que voltou perdidamente apaixonado para os seus braços.

Para aceitar se casar novamente com o rapaz, algumas condições foram impostas pela mulher, todas aceitas por Gil. A mansão e os carros ficariam apenas no nome da esposa e todas as contas bancárias seriam abertas em conjunto. O moço aceitou tudo, afinal, ele conhecia muito bem Cleptonilda e sabia que ela jamais faria algo que o prejudicasse.

Uma semana após o enlace, lá estava Gil, posto para fora do seu lar, doce lar, apenas com a roupa do corpo e com as contas bancárias rapadas pela mulher vingativa, que se tornou a mais nova rica, livre, leve e solta bela do pedaço.

(Imagem ilustrativa: Freepik)

Conto escrito pela jornalista Claudia Rato, autora do livro Pra mim você morreu. Leia outros contos com histórias inusitadas de amor.

Para adquirir o livro, acesse aqui.

Marcelina, Rapunzel

Marcelina, Rapunzel

Marcelina saiu de casa se sentindo o último patinho feio do universo. Para disfarçar a desmazelice do cabelo, sem lavar há três dias, fez duas tranças, feito Rapunzel, e saiu, despretensiosamente. Respirou firme, pegou a sua garrafinha de água e foi para a aula diária de spinning.

Suada, cansada, mas com ar de felicidade de quem matou qualquer indício calórico decorrente de seus deslizes de chocólatra assumida, lá estava a moça, caminhando a pé, de volta ao seu humilde lar.

A bela não resistiu à tentação e parou em uma loja de conveniência. Sorriu para todos, pois estava feliz, sem sequer saber o motivo. Avistou um rapaz, que a ela sorriu também, pegou o seu pacotinho de suspiros e rumou para o seu destino.

A noite estava linda. A lua, grandiosa e cheia de graça. Os carros se entrepassavam pela avenida, até que um deles parou ao lado de Marcelina e uma voz encantadora soou nos ouvidos da moça. Era o mesmo do sorriso…

_ Sabia que você é muito bonita?

_ Obrigada.

_ Posso te conhecer?

_ Hoje não!

_ Qual seu nome?

_ Marcelina

_ Ok, você é linda!

Os passos de Marcelina seguiram caminho e o carro também, distanciando-se cada vez um do outro.

_ Marcelina, Marcelina, sua burra, como assim hoje não, hoje não??? E quando será, sua idiota? O cara sequer sabe quem é você! Anotou a placa? Não, né! Sabe quando ele vai te encontrar nessa cidade enorme? Nunca mais! _ disse para si, eufórica com o elogio, mas ao mesmo tempo incrédula por não seguir o papo adiante.

Assim que chegou em casa foi ver se o rapaz a havia encontrado na internet. Ah, sim, você acha mesmo que ele vai fazer uma busca por todas as Marcelinas deste mundo até te encontrar, né, ô cara pálida? Acorda, menina, perdeu _ falou sozinha, olhando para o espelho.

Não foi fácil dormir naquela noite. A cada meia hora a jovem sonhadora olhava o celular em busca de um oi qualquer do desconhecido do sorriso encantador daquela loja de conveniência.

Dia seguinte, sequer conseguiu trabalhar no renomado restaurante da cidade onde era reconhecida a melhor chef da gastronomia francesa. Tudo dessalgou, ou salgou demais. A cabeça estava em outro lugar. Naquela avenida…

Nessa mesma noite, Marcelina seguiu seu ritual, trancinha no cabelo, exercício puxado de bike na academia, loja de conveniência, caminhada a pé em casa, mas dessa vez com o melhor look, make perfeita, perfume do mais caro, tudo.

A cena se repetiu por mais alguns dias e nada de a bela rever o tal rapaz. Ela não sabia mais o que fazer para tentar esse reencontro platônico até ter uma ideia um tanto quanto inusitada, vulgo loucura de amor.

Marcelina colocou uma faixa exatamente onde foi abordada pelo rapaz com os dizeres: Ei, você, que me achou tão bonita, onde estás? Passo aqui todos os dias, no mesmo horário. Ainda quer me conhecer?

Para sua decepção, nada de o moço aparecer. Desiludida, passou a se produzir cada vez menos para ir às aulas e voltou à desmazelice de sempre, sentindo-se novamente a pata mais feiosa de todas….

Já nem mais ligava para o estratégico e furado ritual da tentativa do reencontro com o belo, até o dia em que sentiu um cheiro atrativo de suspiro no ar e suas tranças cor de mel se encontraram frente a frente com aquele mesmo sorriso de encanto sereno naquela mesma loja de conveniência.

Sem saber o que fazer ou dizer, Marcelina deu um meio sorriso, desviou timidamente o rosto com olhar cabisbaixo e seguiu adiante, passo a passo, rumo ao seu destino, destino esse que dessa vez a levou para outro lugar.

A noite estava linda. A lua, grandiosa e cheia de graça. Os carros se entrepassavam pela avenida, até que um deles parou ao lado de Marcelina e uma voz encantadora soou nos ouvidos da moça.

_ Sabia que você é muito bonita?

_ Obrigada.

_ Será que hoje posso te conhecer?

_ Com certeza.

(conto de Claudia Rato – autora do livro Pra mim você morreu – para adquirir o livro, acesse a conta do instagram)